Artigo

Gaza, o próprio inferno

É inconcebível que a comunidade internacional não adote medidas urgentes e incisivas para deter a matança

Centros de distribuição de alimentos na Faixa de Gaza foram palcos de cenas caóticas nos últimos dias -  (crédito: Reuters)
Centros de distribuição de alimentos na Faixa de Gaza foram palcos de cenas caóticas nos últimos dias - (crédito: Reuters)

Sobreviver. É a isso que 2 milhões de palestinos desesperados se agarram a todo o momento. Exaustos da morte que lhes acompanha há mais de 600 dias, e forçados a se mudar por várias vezes, agora são subjugados por outro pesadelo: a fome. Que consome entranhas, rouba esperanças e trai os instintos. De prisão gigantesca, a Faixa de Gaza tornou-se terra de famintos, cemitério e pilhas de ruínas.

Escrevo este artigo após tomar conhecimento de que 27 palestinos foram mortos, supostamente por disparos de tanques israelenses, enquanto se aproximavam de um centro de distribuição de ajuda humanitária em Rafah, no sul da Faixa de Gaza. Não é o primeiro incidente absurdo do tipo. Provavelmente, também não será o último. A cumplicidade dos poderosos do mundo que se silenciam também representa sentença de morte para os palestinos, muitos deles esquálidos. 

A médica que perdeu nove dos 10 filhos e o marido; a menina que relatava, pelas redes sociais, a rotina da guerra e morreu durante um bombardeio; o jornalista que sepultou três filhos, um deles esmagado por um tanque israelense. As histórias de horror se multiplicam. Todos os dias, vídeos dantescos revelam a face mais cruenta do ser humano.

Crianças despedaçadas pelas bombas, filas de corpos envoltos em mortalhas, bombas que caem do nada entre a multidão, um pé humano decepado sendo devorado por um cão sob uma cadeira. Para muitas mentes sensatas e desintoxicadas da ideologia dos extremos, o que acontece na Faixa de Gaza é, pura e simplesmente, punição coletiva, um crime de guerra que precisa ser julgado e punido com todo o rigor. 

A complacência dos engravatados subverte a lógica da humanidade, muitas vezes, movida por interesses econômicos. O mundo não pode se calar ante a matança na Faixa de Gaza. Uma guerra que somente fomenta ódio, dor, desespero, violência. Imagino o que será de milhares de crianças que se tornaram órfãs, que testemunharam cenas dantescas ou que viram a fome devorar seus sonhos mais lindos. Muitas buscarão nada mais do que vingança. A guerra em Gaza pode estar semeando um exército de extremistas ávidos pela retribuição de sangue. 

É inconcebível que a comunidade internacional não adote medidas urgentes e incisivas para deter a matança. Sanções financeiras e diplomáticas estão entre as ferramentas capazes de pressionar pelo cessar-fogo. Mas, também, um desejo genuíno de mediar uma trégua e um plano de paz. A longo prazo, a solução para o conflito no Oriente Médio a por concessões dolorosas e necessárias para a viabilização da coexistência de dois Estados — Israel e Palestina — soberanos e independentes. Somente assim o extremismo dos dois lados terá fim.  

 

postado em 04/06/2025 06:02 / atualizado em 04/06/2025 07:27
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